sábado, 17 de outubro de 2009

da beira do caos
à beira do cais
um corpo transborda pra dentro
afunila dimensões corpo adentro
trepida nos movimentos para além do centro

na beira do cais:
caos

inquieta-se no espaço vazio
à beira do cais
alaga-se no vento
e sopra-se no mar
à beira do caos
abisma-se no ar
precipita-se na margem
na beira do caos.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Uma prosa inacabada sobre Mito

Inda pouco li o que é mito, que ainda teima em perdurar no inconsciente seletivo e no processo coletivo da massa entoada e passiva, até não mais. Massa acomodada, que dorme à espera do dia em que.
Caminhamos, convictos da certeza, mas não sabemos nem. A imagem perdura. Mitos, santos, milagres, bonecas infláveis, adornos e pingüins de geladeira. A imagem embaça os olhos de quem vê mas não vê. Enjoamos fácil, esquecemos rápido e o que fica ninguém quer saber ninguém quer saber ninguém quer saber ninguém quer saber ninguém quer saber ninguém quer saber...

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Sou a sombra de mim, desmedida
Vagueio longe, eu-mim
conectadainterligadantenada
sintonizada com as bossas, as novas
Reinvento palavras sem fim, recrio
no meu
novo vernáculo
nomeio nomes
e insisto que elas sejam absolutas
quando em estado de matéria
Frívolas (quem sabe) e inquietas, como eu
eu
que transito por todos e todas
faço um brinde ao cult da art nouvelle vague
nos botequins de chouriços e balangandãs
eu
que vivo a eterna busca que se assom(br)a além de mim
Me enrosco também em meu casulo
Presa ainda nos ideais obsoletos do avant-garde.
Mas participo da massa:
Sou esfinge enlaçada.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Imagens e palavras que sugerem, apelam.























terça-feira, 23 de junho de 2009

um poema só

COM
PONHO
O
VER
E
SO
T
s O
U
A
VER

NA
VI OS
SO

segunda-feira, 22 de junho de 2009

o homem e as pedras

...e assim ele largou o emprego público e resolveu catar pedras pelo caminho. E assim começou a sentir interesse em levar para casa as mais diversas espécies de pedras, mesmo sem nenhum valor, porque acharia que, com isso, estaria, de alguma forma, dando seguimento à existência. Andava pelas ruas de cabeça baixa, sempre à espera de que aparecesse algo esférico ou oval, que fosse reluzente ou opaco. Catava-as perto de obras em construção, vasculhava pedreiras, circundava regiões vizinhas à praia. Certa vez andou quilômetros até esbarrar em litorais rochosos, entrecortados de recifes e algas. Passou dias a escolher as mais bonitas, sempre carregando-as em suas algibeiras, para depois lançar tudo quarto adentro, quando a casa retornasse. Admirava seus encantos, deslizava-as por entre as mãos, tinha um olhar fixo, talvez doentio. Era o seu deleite recentemente descoberto, depois que pediu demissão do emprego. Regozijava-se das ondulações de cores, do verde quase azul, da furta-cor das quase preciosas pedras, já que não podia alcançar as verdadeiras preciosidades: seu ofício burocrático e pouco remunerado não lhe permitia maiores gastos. Fatigado de fixar olhar sobre as brilhosas, decidiu que seu ideal seria colecionar as mais rudes e inexpressivas pedras das ruas, pelo seu encanto, talvez pelo efeito tosco que algumas delas traziam e que o fascinavam. As de brilho também eram recolhidas, mas não surtia o mesmo efeito de encantamento. Passou certo tempo nas montanhas, recolhendo as mais rústicas, achando que, com isso, estaria mais próximo da essência que todo homem acabaria por se render. O gesto final, a vida final, a inevitável essência final. Seca e simples, fruto de sua existência mesquinha.
Na subida da montanha, encarou as subidas íngremes, arranhou-se na subida, deu cabo da descida. Pelo caminho encontrou mais e mais pedras. O peso de seu corpo quase não podia com as algibeiras rebentadas. Sentou-se. Depois que recolhia as do dia, dava-se por satisfeito, ia embora. Uma vez, em casa, extasiado, pensou consigo: não me interesso saber nomes, espécies, origem, pouco importa. Nada lhe tirava o prazer do achado, da delícia que era encontrar o que a ele lhe pertencia de direito. Sabia que havia percorrido um caminho. Precisava percorrer, seguir. Acima de tudo, seguir fundo na existência, até o fim.
Sem que se desse conta, já com cabelos brancos, certo dia escolheu as menos lapidadas, deitou-se na cama, cobriu-se de centenas delas. Decidiu assim permanecer por horas. Ficou a manhã toda. A tarde toda. Enfim, ficou o dia todo, sem mover sequer o lábio, de olhos fechados, até que se consolidasse o extremo êxtase de senti-las todas juntas dele. Queria sentir-se mais uma vez, desde que nasceu: pedra tosca. A sensação sólida inesgotável. A prova cabal da existência. Necessitava sentir a essência da vida, da energia bruta, solidificada, empetrecida, por sobre seu corpo já esquálido. De olhos fechados para o mundo, sentiu, por fim, a vida se esvair, e a materialização de tudo estava sendo feita. Ficou a um só fôlego, petrificado, sem mais o brilho do olhar, matéria roxa, seca, fria, tão fria quanto às pedras que escolheu.

Ensaio para uma composição antipoética

Tomei a liberdade quase poética de uma quase licença tomada de assalto num rompante expressionista, ao sentir a relevanciânsia de estar só no mundo. E sozinha inverto, converto, invento o verbo, solto à moda de língua ferina, mas sou calma, como mar revolto. A multidão cresce na solidão de mim, e sem juízo surto no tempo impreciso do quando. O que passou por trás de mim fechou-se, deu às costas, feito um cerrar sem fim de portas, bateu asas, voou, até não mais ver. Foi só um assombroescombro do que não foi nem teria-como-ter-sido. Mas leve me elevo. Fica a sombra, fica a paisagem longínqua, fica a poeira. O tempo se fixa aqui, quer ser perene dos momentos já-eram. Não deixo, não posso com o peso do tempo no momento-já! Quero espaço maleável para ser mais de mim: vária. Tem um caminho à frente, tem rochas, tem pedras, tem asfalto. Tem homens passando. Gente de olhares frívolos olhares rochas que passam, passam, tateiam pelos espaços em branco onde demarquei terreno arenoso movediço, vão e vem, poucos ficam, atropelam, mesclam. Chego a enroscar gente, insinuar trocas, fito o olhar, lanço o bote, fisgo o enlace, laço o que nem sempre desenlaça, perco a viagem, vêm outras paragens, busco sombra, busco abrigo, encontro abrigo. Sento, paro, me esqueço, olho mais ao longe...Sou calma, procuro o branco do espaço demarcado: onde foi que eu deixei? Ondas turbulentas, olho pra frente: vou e venho, de novo esqueço. Passou, sou só de novo e só.
M.V.

domingo, 21 de junho de 2009

Aos amigos, meu anti-manifesto

Ainda que Manifesto, não preciso usar vocativos nem o tom entusiástico de uma Ode. Nada de Ei-a! Oh! Dá-lhe!
Prefiro gritar Viva!
Quero os amigos perto, quero gente, sou hedonista! Sou a favor do beijo, quero tocar na mão, quero olhar no olho para ver se há afeto compartilhado.
Digo não ao cinismo filosófico, ao discurso humanista de porta de botequim!
Digo sim à celebração da vida!
Viva os eus que me preenchem nos momentos de solidão - eu que sou vária, e corro o risco de esquecer de mim, para viver o outro e os outros!
Viva os amigos, fartos de mim, crentes em mim: eu que compartilho tudo e não sobra nada!
Viva o cerco que não me fecha, apontando para o sol que brilha de manhã, por mais que chova!
Viva a lua, que incita ao prazer, às divagações que me fazem viver minha suprarealidade!
Viva a humanidade, que teimo em acreditar, mesmo que a ferida da destruição e o desapego doam!
Nasci no carnaval, por isso, sou festiva, docemente intempestiva, loucamente serena.